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O Repatriamento dos Prisioneiros de Guerra

Os primeiros prisioneiros Britânicos chegaram a França a 15 de Novembro de 1918, quatro dias após o Armistício e utilizaram o porto de Dunquerque para serem transportados ao Inglaterra. A 9 de Dezembro de 1918, 264.000 prisioneiros de todas as nações aliadas, grande parte franceses, já se encontravam repatriados ou no caminho de regresso. Muitos prisioneiros foram libertados pelos alemães em massa e enviados através da linhas de guerra aliadas de França e Bélgica, o que levou a que muitos prisioneiros viessem a morrer de exaustam durante o regresso, devido à subnutrição que estiveram sujeitos durante o cativeiro.  


Os aliados não estavam preparados para receber de repente o regresso dos milhares de prisioneiros. Em princípio, e de forma improvisada, foram recolhendo em camionetas os prisioneiros libertados e transportavam-nos para centros de recepção ou de acolhimento temporário, onde os reequipavam com vestuário novo e os alimentavam, para posteriormente os despachar para os portos de embarque, Dunquerque para os ingleses e Cherbourg para os portugueses, por via férrea.


É de notar que enquanto os prisioneiros aliados foram enviados para casa, não foi garantido o mesmo tratamento para os prisioneiros das potências centrais que se encontravam em França e na Rússia, muitos ainda se encontravam presos, ou mesmo obrigados a trabalhos forçados, quando a intervenção do Comité Internacional da Cruz Vermelha e do Concelho Supremo de Guerra em 1919, requereram que os prisioneiros Alemãs, Austro-Húngaros e do Império Otomano fossem libertados.


Em 11 de Abril de 1920 a Sociedade das Nações organizou a repatriação de 425.000 prisioneiros das potências centrais que ainda se encontravam detidos pelos Aliados e na Rússia.


Repatriamento

O Regresso dos Soldados Portugueses

O regresso das tropas portuguesas prolongou-se  durante vários meses após o final dos combates e para muitos prisioneiros esse regresso só aconteceu dois anos depois. Em 23 de Novembro de 1918 regressaram 485 militares e em Dezembro seguinte regressou, via Brest, mais um contingente de soldados do CEP provenientes de França (Ilustração Portuguesa, N.667).


Em Dezembro de 1918, considerava-se que quase todos os prisioneiros de guerra portugueses já se encontravam livres dos campos de prisioneiros da Alemanha e a caminho da fronteira de França, Bélgica ou Holanda, para posteriormente serem embarcados para Portugal (Ilustração Portuguesa, n.669).

Em 9 de Dezembro de 1918, partiu do porto de Cherbourg o primeiro contingente de prisioneiros militares do Corpo Expedicionário Português a ser repatriado. Na recepção aos militares esteve presente o Sr. Presidente da República Almirante João do Canto e Castro Silva Antunes, que acompanhado pela sua comitiva, assistiram ao desembarque dos soldados repatriados.



Chegada a Lisboa, no dia 2 de Janeiro de 1919, o primeiro transporte de repatriados no navio português "NRP Pedro Nunes" que repatriou cerca de 710 prisioneiros de guerra provenientes de campos de concentração alemães. A imagem foi tirada momentos antes de o navio atracar ao cais do Posto de Desinfecção.


Na imagem segue à direita do Sr. Presidente o  Capitão de Mar e Guerra Ivens Ferraz e à sua esquerda General Côrte Real


 Saída dos militares do navio "NRP Pedro Nunes" para o cais.

As senhoras da Cruzada das Mulheres Portuguesas e da Instituição das Madrinhas de Guerra, acolheram os militares no cais do Posto de Desinfecção, distribuindo pelos recém-chegados café, bolos e tabaco. Na recepção oficial que aconteceu no dia seguinte à chegada, 3 de Janeiro, para além de estarem presentes entidades oficiais, também estiveram presentes muitas senhoras da Comissão Protectora de Prisioneiros de Guerra e representantes da Cruz Vermelha.  


Em Janeiro de 1919 continuavam em plena actividade os serviços de repatriação dos prisioneiros de guerra que ainda se encontravam disseminados pelos vários campos de concentração da Alemanha (Gross Born, Friedrichesfeld, Schneidemühl e Breesen).  Nesta data vários soldados portugueses já tinham conseguido transpor a fronteira alemã, de acordo com informações oficiais, mas de forma desorganizada que se afiguraram mais a fugas individuais. Pelo menos seis oficiais capturados em 9 de Abril de 1918 já se encontravam em Lisboa, entre os quais o Capitão Santos Nogueira, que escapou do campo de concentração de Breesen, esposo da Sr.ª D. Maria del Pilar Santos Nogueira, Secretária Geral da Comissão Protectora dos Prisioneiros Portugueses.


Em 19 de Janeiro de 1919 chegou um segundo transporte de 1.529 prisioneiros de guerra, a bordo do navio inglês "Helenus", os quais foram de seguida dirigidos para o Depósito de Adidos da Guarnição de Lisboa.


Em Fevereiro de 1919 o navio inglês "Helenus" transporta um novo repatriamento de tropas portuguesas.

Estas são recebidas, no cais, pelo representante do Sr. Presidente da República Alferes Palma, o Sr. Ministro da Guerra Tenente-Coronel Freitas Soares e o chefe da missão inglesa em Lisboa General Barnardiston. Os soldados foram recebidos pelas madrinhas de guerra, composto por um grande numero de senhoras inglesas, que lhes distribuíram donativos.


No dia 19 de Abril de 1919, chegou a Lisboa o navio inglês "Menominee" com 1.337 soldados portugueses repatriados de França. Estiveram presentes representantes oficiais e um contingente da marinha que lhe fez guarda de honra.


No dia 28 de Abril de 1919, chegou a Lisboa um novo transporte de prisioneiros de guerra portugueses, a bordo do cruzador inglês "Northwestern Miller", que foram recebidos pelo Sr. Ministro da Guerra Alferes Palma, em representação da República.


Entre eles regressou o Coronel Felisberto Alves Pedrosa, que também se encontrava prisioneiro desde 9 de Abril de 1918.  Os militares regressaram comprimindo-se na amurada do navio.


O regresso de outros contingentes de tropas não receberam igual manifestação de apresso e carinho à chegada, tendo-se camuflado a chegada de alguns contingentes pela demora e limitações de transporte (Rosas, 2010:353).

Apoio aos Militares Repatriados

O Triângulo Vermelho, instituição Norte-Americana que se irradiou pelo mundo, chegou a Portugal após a intervenção no teatro de guerra em França. Dedicou a sua acção de beneficência em Portugal em prol dos soldados , acção que já efectuava em França durante a guerra. A constituição do Triângulo Vermelho Português (TVP), este teve como objectivo a assistência moral e material dos repatriados.


O TVP através do seu comité internacional, também auxiliou os nossos prisioneiros que se encontravam retidos na Alemanha. Foi considerada a instituição que mais ajudou directamente os nossos militares em França.


Em 24 de Março de 1919 inaugurou, na então Rua Vinte e Quatro de Julho em frente ao jardim de Santos, tendas de apoio onde forneciam aos militares tabaco, chá, café, chocolate, papel de carta e, ainda, disponibilizavam espaço para jogos sociais e cinema, sempre com o intuito ocupacional dos soldados, enquanto esperavam transporte para regressar às suas famílias.


Na imagem anterior da esquerda para a direita: Major Chaby, representante do Quartel General Territorial do CEP; Coronel Swan, adido militar inglês; General Brainard, adido militar americano; Coronel Bernard, adido militar francês; (?), representante do Ministro da Marinha; Coronel Thomaz Birch, ministro dos Estados Unidos da América do Norte; Coronel Paulino d'Andrade, Comandante Geral da Guarda Republicana; (?), ajudante-de-campo do Coronel Paulino d'Andrade; General Aguiar, representante do Ministro da Guerra.


Bibliografia



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